quinta-feira, 27 de junho de 2013

DIVULGAÇÃO TÉCNICA - AT 04 - MÓDULO DE ELASTICIDADE DO CONCRETO

A discussão do módulo de elasticidade dos concretos é sempre tema importante, e algumas vezes controverso no meio técnico. Trazemos aqui um artigo do Eng. Antonio Carlos Leal, em que foram coletados resultados de produção dos concretos em 2 grandes produtores do Distrito Federal, e analisados quando a seu comportamento mecânico. Agradecemos aos parceiros pela disponibilização da oportunidade para o estudo. 
Prof. E. Bauer
Dissertação disponível em: www.estruturas.unb.br



VALORES DO MÓDULO DE ELASTICIDADE DE CONCRETOS COMERCIAIS DA REGIÃO DO DISTRITO FEDERAL
Elton Bauer; Cláudio Henrique de Almeida Feitosa Pereira;
Antonio Carlos Ferreira de Souza Leal

Resumo
A produção do concreto é uma atividade extremamente dinâmica com variação da origem dos agregados, dos cimentos, dos aditivos, dos traços e dispersões na própria produção. A resistência à compressão, antes praticamente o único fator de interesse dos projetistas e tecnologistas de concreto, com a introdução da verificação das estruturas também para os estados limites de utilização e com a necessidade cada vez maior de se antecipar a entrada em carga das estruturas, passa a necessitar do acompanhamento de outros parâmetros como o módulo de elasticidade, a porosidade e a resistência à tração. Este artigo tem como proposta o relato dos resultados da dissertação de mestrado onde foram investigadas as características dos materiais utilizados e parâmetros de mistura como fatores determinantes nas propriedades do concreto com ênfase no módulo de elasticidade, inclusive a sua evolução ao longo do tempo. Marca o início de uma possível caracterização sistemática do concreto utilizado na região do Distrito Federal (DF).
Palavras-chave: Concreto, módulo de elasticidade, resistência.


1.      INTRODUÇÃO
Este trabalho tem origem em dissertação de mestrado inserida na linha de pesquisa Sistemas Construtivos e Desempenho de Materiais do Programa de Pós-Graduação em Estruturas e Construção Civil do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília
2.      OBJETIVOS
O objetivo geral deste trabalho é a investigação experimental do módulo de elasticidade nos concretos produzidos no Distrito Federal - DF.
Os objetivos específicos constam da identificação e análise das propriedades do módulo de elasticidade e resistência à compressão dos concretos mais produzidos no DF, em duas concreteiras independentes, que utilizam materiais e processos diferenciados. Estes objetivos são:

a)      Investigar a influência dos parâmetros de mistura no desenvolvimento das propriedades módulo de elasticidade e resistência à compressão dos concretos.
b)      Investigar a variabilidade das propriedades módulo de elasticidade e resistência à compressão em função das variações de produção e entre diferentes produtores.
c)      Correlacionar os valores de resistência à compressão e o módulo de elasticidade longitudinal.
3.      REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
O valor do módulo de deformação de um material é determinado por sua composição e, apenas indiretamente, relacionado com as demais propriedades mecânicas (VAN VLACK, 1970). Em materiais heterogêneos e multifásicos como o concreto, características como a fração volumétrica, a massa específica, o módulo de deformação dos principais constituintes, as características da zona de transição e também os parâmetros de ensaio determinam o comportamento elástico do compósito (VASCONCELOS e GIAMMUSSO, 1998; WAN e LI, 2006; MEHTA e MONTEIRO, 2008).
Silva (2003) em estudo do módulo de elasticidade tangente inicial de concretos da região de Goiânia, variou a relação água/cimento para três tipos de agregados graúdos: calcário, seixo e basalto. A pesquisa mostrou que existe uma diminuição do módulo de elasticidade com o aumento da relação água/cimento. O módulo de elasticidade do concreto variou diretamente com o módulo de elasticidade do agregado graúdo, apresentando valores mais elevados para o basalto, seguido do calcário e por último o seixo.
O módulo de elasticidade da matriz da pasta de cimento é determinado por sua porosidade. Os fatores preponderantes são a relação água/cimento, teor de ar, adições minerais, grau de hidratação do cimento e tipo de cimento.
Vazios capilares, microfissuras e cristais orientados de hidróxido de cálcio são relativamente mais comuns na zona de transição na interface do que na matriz da pasta; por isso têm um papel importante na determinação das relações tensão-deformação do concreto. Os fatores que controlam a porosidade da zona de transição na interface são: relação água/cimento; características de exsudação; adições minerais; granulometria; dimensão máxima e geometria do agregado; grau de adensamento, grau de hidratação; tempo de cura; temperatura; umidade e a interação química entre o agregado e a pasta de cimento (MEHTA E MONTEIRO, 2008).
Os parâmetros de mistura influenciam no módulo de elasticidade quando modificam a relação entre os agregados e a pasta de cimento. O agregado contribui de modo a aumentar o módulo de elasticidade do conjunto em função do seu maior módulo de elasticidade relativamente à pasta de cimento.
Melo Neto e Helene (2002) constataram que com o acréscimo do consumo de cimento, mantendo-se a relação água/cimento constante, há um decréscimo do módulo de elasticidade. A explicação reside no fato de que a manutenção da relação água/cimento acarreta numa diminuição do teor de agregados e consequentemente aumento da pasta de cimento que, como já visto, contribui de forma a diminuir o módulo de elasticidade. Por outro lado, se o abatimento for mantido e o consumo de cimento for aumentado, a relação água/cimento diminuirá, aumentando o módulo de elasticidade.
Além destes fatores, a forma dos corpos de prova e as condições de cura e ensaio também influenciam no módulo de elasticidade.
4.      METODOLOGIA DO PROGRAMA EXPERIMENTAL
No período deste estudo, de maio a outubro de 2011, por meio de entrevistas com os maiores fornecedores de concreto do DF, verificou-se que o concreto de densidade normal C30 (fck = 30 MPa), bombeável e com abatimento de 100 mm ± 20 mm, foi o mais utilizado na região. Deste modo, o concreto classe C30 foi indicado como o concreto-referência deste estudo e a variável independente adotada foi a resistência á compressão.
As propriedades módulo de elasticidade e resistência à compressão dos concretos foram obtidas da análise de amostras de concretos coletados diretamente na usina de duas concreteiras diferentes, CA e CB. De forma a criar parâmetros de referência, além do concreto C30, foram estudados também concretos de classe mais resistente (C40) e menos resistente (C20), como pode ser visto na Figura 1.
Para a medida da resistência à compressão foi utilizada a norma ABNT NBR 5739:2007 tomando-se a média de 5 corpos de prova ensaiados.



Figura 1 – Concretos estudados das concreteiras CA e CB
Para o módulo de elasticidade longitudinal foi tomada a média de 3 corpos de prova ensaiados de acordo com a norma ABNT NBR  8522:2008. Os ensaios foram feitos em corpos de prova cilíndricos de 10 cm de diâmetro por 20 cm de altura. A proporção em volume dos concretos estudados e características físicas dos componentes são as apresentadas na Tabela 1.




Tabela 1 – Consumos de materiais dos traços estudados




5. RESULTADOS ENCONTRADOS E DISCUSSÃO

Os valores do módulo de elasticidade e resistência à compressão medidos aos 28 dias encontram-se na Tabela 3. Nesta tabela encontram-se também os valores do módulo de elasticidade estimados a partir da resistência à compressão conforme a expressão empírica de proposta pela norma ABNT NBR 6118:2007.
O cálculo do valor da resistência à compressão característica (fck) foi feito de acordo com a Equação 01 preconizada pela norma ABNT NBR 12655:2006. O desvio padrão adotado foi de 4,0 MPa de modo que a parcela 1,65 Sd resultou em 6,6 MPa. 

                                     fcj  = fck  + 1,65 Sd                                                  [Eq. 01]

Dos valores obtidos do concreto-referência (CA30 e CB30), observou-se uma variação do módulo de elasticidade de 24,3% entre eles. A resistência à compressão variou em 9,2% e os valores da resistência à compressão característico (fck) foram maiores que o valor nominal (30 MPa).



Tabela 2 – Valores da resistência à compressão e módulo de elasticidade aos 28 dias



Os valores do módulo de elasticidade obtidos para os concretos CA30 e CB30 foram maiores em 7,4% e 26,6%, respectivamente, em relação ao conseguido de acordo com a equação de previsão da norma ABNT NBR 6118:2007.

Deste modo, diante da variabilidade dos valores das propriedades módulo de elasticidade e resistência à compressão, pode-se inferir que os concretos estudados têm comportamentos diferentes, apesar de estarem enquadrados na mesma classe.

Da análise da influência dos parâmetros de mistura no módulo de elasticidade das amostras de cada concreteira percebe-se, na Figura 2, a existência de uma associação inversa entre a relação água/cimento e o módulo de elasticidade. Este comportamento pode ser justificado pelo aumento da quantidade de água que resulta numa pasta mais porosa, diminuindo sua rigidez e, consequentemente, o módulo de elasticidade e a resistência à compressão do concreto (SILVA, 2003; JACINTHO E GIONGO, 2005).



Figura 2 – Módulo de elasticidade em função da relação água/cimento

Com relação ao consumo de cimento constatou-se a existência de uma associação direta entre esse parâmetro e o módulo de elasticidade. Esta associação pode ser vista na Figura 3 e justifica-se tendo em vista que um maior consumo de cimento (para o mesmo consumo de água) na composição do concreto acarreta numa menor porosidade da matriz pasta de cimento, aumentando sua rigidez e, consequentemente, o módulo de elasticidade e a resistência à compressão do concreto (COUTINHO E GONÇALVES, 1994; SILVA, 2003). Uma vez que o valor do abatimento é constante (100 mm), o comportamento é similar ao observado por Melo e Helene (2002).




Figura 3 – Módulo de elasticidade em função do consumo de cimento.

Na Figura 4 é possível constatar a existência de uma associação direta entre a relação agregado graúdo/agregado total e o módulo de elasticidade. Este comportamento pode ser explicado pela capacidade do agregado graúdo de restringir a deformação da matriz, aumentando assim a rigidez do composto e suas propriedades  módulo de elasticidade e resistência à compressão (MEHTA E MONTEIRO, 2008).
Nesta pesquisa foi constatado que os parâmetros de mistura estudados influenciaram o módulo de elasticidade e a resistência à compressão dos concretos sempre da mesma forma, apresentando uma relação direta ou inversa com as propriedades. 
A partir dos ensaios realizados, pode-se concluir que a porosidade da pasta de cimento se apresentou como fator fundamental e comum tanto na variabilidade do módulo de elasticidade quanto da resistência à compressão. O aumento do módulo de elasticidade da pasta de cimento se mostrou a maneira mais eficiente de aumentar o módulo de elasticidade do concreto (LI et al., 1999).





Figura 4 - Módulo de elasticidade em função da relação agregado graúdo/agregado total


Nesse sentido, percebeu-se que a diminuição da relação água/cimento e o aumento do consumo de cimento contribuíram para o fortalecimento da pasta de cimento levando à melhora das propriedades módulo de elasticidade e resistência à compressão.
O agregado graúdo se mostrou como fator de melhora do módulo de elasticidade e da resistência à compressão quando restringe a deformação da matriz, aumentando assim a rigidez do composto e suas propriedades (MEHTA E MONTEIRO, 2008).
De forma a verificar a correlação do módulo de elasticidade secante e a resistência à compressão característica (fck), esses valores foram plotados num gráfico juntamente com as expressões empíricas das normas ABNT NBR 6118:2007, CEB-FIP MC 90 (para agregado calcário) e ACI 318-08, como mostra a Figura 5. Para ampliar a base de observação foram considerados, além dos concretos aqui apresentados, outros concretos, também produzidos na região, utilizados na dissertação de mestrado que deu origem a esse artigo.
A curva de tendência ajustada a esses pontos se mostrou próxima da equação preconizada pela ABNT NBR 6118:2007, com valores superiores para os concretos com resistência até 45 MPa e inferiores para concretos acima deste valor. Resultou também paralela à equação do CEB-FIP e ficou contida no intervalo do ACI.



Figura 5 – Correlação entre o módulo de elasticidade secante (Ecs) e a resistência à compressão 
característica (fck) com a aplicação das expressões empíricas da ABNT NBR 6118:2007, do ACI 318-08 e do CEB-FIP MC 90


6. CONCLUSÃO 

No período estudado, acerca das propriedades módulo de elasticidade e resistência à compressão dos concretos fabricados no Distrito Federal observou-se o seguinte: 

a) O parâmetro de mistura consumo de cimento (para mesmo abatimento) se apresentou como fator fundamental na evolução do módulo de elasticidade o que indica o aumento do módulo de elasticidade da pasta de cimento como a maneira mais eficiente de aumentar o módulo de elasticidade do concreto (LI et al., 1999).
b) Os concretos estudados apresentaram grandes diferenças nos valores das propriedades módulo de elasticidade e resistência à compressão apesar de estarem enquadrados na mesma classe de resistência.
c) A curva de tendência dos valores resistência à compressão – módulo de elasticidade se mostrou próxima da equação preconizada pela ABNT NBR 6118:2007. Os valores observados foram parcialmente discordantes dos previstos poe essa norma. Pelos resultados encontrados, observa-se que ocorre uma subestimação do módulo de elasticidade até a resistência à compressão de 45 MPa e, acima deste valor, a norma superestima o valor do módulo de elasticidade.


REFERÊNCIAS 

AMERICAN CONCRETE INSTITUTE (ACI). ACI  318-08 – Building Code Requirements for Structural and Commentary. Farmington Hills, Michigan, 1998.

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR 5739: Concreto -  Ensaio de compressão de corpos de prova cilíndricos. Rio de Janeiro: ABNT, 2007.

_____. NBR 8522: Concreto – Determinação do módulo estático de elasticidade à compressão. Rio de Janeiro: ABNT, 2008.

_____. NBR 6118: Projeto de estruturas de concreto armado. Rio de Janeiro: ABNT, 2007.

_____. NBR 12655: Concreto de cimento Portland – Preparo, controle e recebimento - Procedimento. Rio de Janeiro. ABNT, 2006.

COMITÉ EURO-INTERNACIONAL DU BÉTON - CEB. Selected Justification Notes. Bulletin d’information n.217, Lausanne, 1993.

COUTINHO,  A.; GONÇALVEZ, A. Fabrico e propriedades do betão. Volume III, 2ª ed., Laboratório Nacional de Engenharia Civil - LNEC, Lisboa, 1994.

JACINTHO, A.; GIONGO, J. Resistência Mecânica do Concreto. In: Isaia, G. C. (Ed.). Concreto – Ensino, Pesquisas e Realizações. 1ª ed. São Paulo: SmartSystem Consulting, 2005.

LI, G.; ZHA ,Y.; PANG S, LI Y. Effective Young’s modulus estimation of concrete. Cement and Concrete Research 29. 1999.

MEHTA, P.K.; MONTEIRO, P.J.M. Concreto Microestrutura, Propriedades e Materiais. São Paulo: 3ª ed. IBRACON, 2008.

MELO, A.C. NETO; HELENE, P. Módulo de elasticidade: dosagem e avaliação de modelos de previsão do módulo de elasticidade de concretos. 44º Congresso Brasileiro: São Paulo: Ibracon, 2002.

SILVA, K.J. Estudo do comportamento do módulo de deformação de concretos, com um ano de idade, produzidos com diferentes tipos de agregados graúdos. Trabalho de conclusão de curso (Graduação) – Coordenação da área de Construção Civil, Centro Federal de Educação Tecnológico de Goiás. Goiânia, 2003.

VAN VLACK, L. H. Princípios de ciência dos materiais. 13ª ed. São Paulo: Edgard Blücher, 1970.
VASCONCELOS, A.C.; GIAMMUSSO, S.E. O misterioso módulo de elasticidade. IBRACON, 40, 2000. Rio de Janeiro, 2000.







segunda-feira, 24 de junho de 2013

ARTIGO TÉCNICO AT 20 - INVESTIGAÇÃO EM OBRA: REQUISITOS DAS ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO

Apresentamos estudo de avaliação de requisitos das argamassas em avaliação de aplicações em obras.
Essa contribuição se destina a alertar sobre a necessidade de melhor entender as características projetuais e de execução dos revestimentos em argamassas.
Boa leitura,
Prof. E. Bauer (mat and mat)

REQUISITOS E DESEMPENHO DE ARGAMASSAS DE REVESTIMENTO
ELTON BAUER (*),CLAUDIO PEREIRA FEITOSA (*),HALLEY RODRIGUES FILHO (**),PHELIPE OLIVEIRA DE ALMEIDA(***)

(*)  Universidade de Brasília – Depto. Engenharia Civil e Ambiental – PECC
(**) Universidade de Brasília – PECC (mestrando).
(***) IESPLAN (graduando)


Revisão e adequação: pesquisadora Yulena Monteiro (mat and mat)
Encaminhado por: Elton Bauer

 INTRODUÇÃO/ JUSTIFICATIVA/OBJETIVOS

Os sistemas de revestimento em geral possuem características particulares e diferenciadas, tanto em relação a sua composição e processo executivo, como também em relação a suas demandas e funções. É interessante observar a extrema solicitação a que os revestimentos são submetidos por:

Estarem submetidos a intensas solicitações atmosféricas (insolação, chuvas, choque térmico, etc.);
Estarem submetidos a solicitações de uso (abrasão, impacto, lavagem, etc.).
Em relação as questões de estética e funcionalidade devem manter-se íntegros, unidos à base, sem desagregação ou fissuração, durante a sua vida útil.
Comporem-se de materiais diferentes e distintos fisicamente, tanto em relação à base, como entre si (base cimentícea, base orgânica, etc.).

Seguramente pode-se afirmar que atualmente os sistemas de revestimento constituem-se em um “gargalo tecnológico”, uma vez que existe grande diversidade de opções quanto às tipologias dos sistemas a utilizar, e mesmo dentro de determinado sistema (por exemplo: revestimento em argamassa de fachadas). Existem também diferenciações muito fortes no desempenho final em função tanto dos materiais (argamassas mistas preparadas em obra, argamassas industrializadas, argamassas estabilizadas, argamassas projetadas) como também no processo de produção dos revestimentos. 

Salienta-se o fato de que significativos avanços têm ocorrido na compreensão dos materiais e sistemas, mas ainda têm-se muitas lacunas de conhecimento e aplicação técnica. De outra parte, é notória a grande ocorrência de patologias, muitas vezes de diagnóstico difícil, principalmente pelo grande número de variáveis envolvidas e pelo sinergismo entre os processos (Bauer(1) et al., 2011). 

Como consequência, continua-se aplicando-se processos equivocados com custos vultosos, tanto  nos procedimentos de reparo decorrentes,  como também no custo de imagem das empresas construtoras, dentre vários outros.

O projeto de especificação de fachada, embora ainda de caráter mais subjetivo do especialista que a elabora do que embasado em definições técnicas, tem permitido ao menos dar importância a definições básicas fundamentais quanto a materiais e técnicas. Do ponto e vista do controle de qualidade as condições são muito mais críticas, com uma carência muito intensa de padrões e rotinas capazes de indicar um bom ou mau desempenho nos processos e produtos.
Do ponto de vista de avaliação experimental das argamassas, é notória a contribuição que a Norma Brasileira NBR 13281 (Argamassa para assentamento e revestimento de paredes e tetos – requisitos) trouxe no sentido de fornecer padronizações elementares. Essa norma capitaneia um conjunto de outras normas de método de ensaio, adaptados da normalização internacional, os quais permitem uma classificação das argamassas em parâmetros mecânicos, físicos e de propriedades no estado fresco. Um dos objetivos dessa classificação é o de que o projetista de fachada não especifique mais a argamassa pelo traço, mas sim especifique classes de requisitos que essa argamassa deva atender. Dessa forma podem-se referendar requisitos (propriedades) como retenção de água, coeficiente de capilaridade, resistência à tração, dentre outras demais, e não somente especificar uma aderência superior a 0,30 MPa. Nesse processo o projetista diminui seu grau de subjetividade passando a ter de especificar em cima de propriedades, sendo que cabe ao laboratório a dosagem e avaliação das argamassas para atender às classes de propriedades definidas.

Os critérios estabelecidos na Norma Brasileira NBR 13281 são listados nas Tabelas 1 a 7.


Em relação aos critérios de avaliação, são clássicos alguns parâmetros de avaliação das normas internacionais para argamassas de revestimento de fachada. Fazendo uma comparação com base nos requisitos e conforme o CSTB (1990)(2), devem ser considerados os seguintes critérios para:

•    Resistência à tração por flexão: para revestimentos cerâmicos colados, o      emboço deve ser classificado como R4 ou superior, e para revestimentos            sujeitos a choques deve ser R3 ou superior;

•    Coeficiente de capilaridade: em paredes expostas à chuva a classe deve       ser inferior a C2, e nas demais situações, inferior a C3.

•    Retenção de água: para clima e tempo quente e seco, considera-se     necessário ser superior a U5. Em termos gerais deve no mínimo ser igual        a U3.

Em relação a resistência à fissuração, Silva (2011)(3) e Veiga(1998)(4) comentam o parâmetro dutilidade. A dutilidade é obtida dividindo-se a resistência à tração (na flexão) pela resistência à compressão. Quanto mais próxima de 1, melhor seria a resistência à fissuração da argamassa.

Quanto aos critérios de consistência, embora fora da classificação de requisitos, a consistência avaliada pela penetração de cone foi empregada neste estudo. Considera-se uma faixa ótima, a penetração entre 50 e 65 mm conforme convergem as pesquisas de Bauer et al. (2007)(5)  e Cascudo e Carasek (2006)(6).

MATERIAIS/MÉTODOS/DESENVOLVIMENTO

A proposição de amostragem foi a de avaliar diferentes condições de uso das argamassas de revestimento, em obras distintas. A rotina de amostragem envolve:

•         Caracterização da produção/aplicação da argamassa;
•         Identificação básica de materiais e fornecedores;
•         Identificação dos traços e quantitativos;
•         Coleta de materiais para reprodução dos traços em laboratório (quando possível).

Em relação às avaliações foram consideradas 2 situações básicas de estudo a saber:

•           CONDIÇÃO A: Avaliação das argamassas nas condições de produção em obra – onde se avaliaram os parâmetros no canteiro (ar incorporado e penetração de cone), e posteriormente encaminhou-se a amostra de argamassa para as avaliações em laboratório;
•           CONDIÇÃO B: Avaliação das argamassas em laboratório – onde as argamassas eram reproduzidas totalmente em laboratório com os mesmos materiais e traços da obra.

O procedimento de ensaio e coleta das amostras seguiu as seguintes etapas:

I.          Identificação da forma de produção em canteiro

II.         Avaliação e ensaios em canteiro

a. Aferição dos quantitativos (em volume aparente) do traço em produção;
b.Coleta e identificação dos materiais (cimento, aditivos e agregados);
c.Ensaios de penetração de cone;
d.Ensaio de ar incorporado;
e. Coleta da argamassa e envio imediato ao LEM/UnB para continuação dos        ensaios de laboratório
f.Remessa dos materiais para reprodução dos traços em laboratório.

Foram efetuadas avaliações da consistência da argamassa e do teor de ar incorporado no momento da produção da mesma. Em sequência, quando do recebimento da amostra de argamassa no LEM (Laboratório de Ensaio de Materiais - UnB) esses ensaios eram repetidos e registrados. Deve-se mencionar que o tempo entre a produção (em obra) e a moldagem em laboratório era de aproximadamente 40 minutos. Em laboratório procederam-se os ensaios no estado fresco conforme listado abaixo:

•           Penetração de cone – (ASTM C780: 1996);
•           Mesa de consistência -(ABNT NBR-13276:2005);
•           Densidade massa no estado fresco – (ABNT NBR 13278:2005);
•           Retenção de água - (ABNT NBR-13277:2005);
•           Teor de ar incorporado (Pressométrico) - (ABNT NM-47:1995).

Além desses ensaios se procedia a moldagem dos corpos-de-prova para avaliação no estado endurecido. Esses ensaios forma efetuados aos 28 dias, sendo os mesmos listados a seguir:

•           Resistência a tração na flexão - (ABNT NBR-13279:2005);
•           Resistência a compressão  - (ABNT NBR-13279:2005);
•           Resistência potencial de aderência à tração (ABNT NBR-15258:2005);
•           Capilaridade - (ABNT NBR-15259:2005);
•           Densidade massa estado endurecido- (ABNT NBR-13280:2005).

A figura 1 apresenta resumidamente os ensaios aplicados na rotina experimental.

As amostras analisadas receberam uma identificação sequencial, conforme detalha a tabela 8 a seguir.

O teor de aditivo plastificante incorporador de ar em todos os casos foi de 0,4% da massa de cimento. Esse aditivo foi usado em substituição a cal em grande parte das argamassas coletadas em obra.

Em relação ao cimento empregado, observou-se diferentes procedências quanto a fabricantes, sendo que todos incluem-se na classe CP II-32. Já em relação à cal, na amostra analisada as obras utilizam a cal CH III.

Quanto as areias utilizadas nas argamassas, identificou-se 3 tipologias identificadas como: areia média de rio (AM), areia fina de rio (AF) e areia de jazida caracterizada como areia rosa (AR). A Tabela 9 apresenta a distribuição granulométrica das areias que fazem parte dessa amostra de estudo.


RESULTADOS/DISCUSSÃO

Os resultados serão apresentados subdividindo-se em análise no estado fresco e análise das propriedades físico-mecânicas.

Análise das propriedades no estado fresco
A tabela 10 traz os resultados referentes ao estado fresco para as argamassas dosadas em obra.

Em relação às condições de produção das argamassas, para o caso da condição A (amostra coletada em obra), foram efetuados ensaios de penetração de cone e ar incorporado. As avaliações foram feitas quando da produção das argamassas (na saída da betoneira). Observou-se nesse caso um valor de 51 mm como medida da consistência em campo, sendo essa ordem de grandeza a usual nas argamassas em geral (50 a 65 mm).

Para o caso do ar incorporado, observou-se para as argamassas do grupo A (A1) e do grupo E (E1), altos valores, sendo respectivamente 12,0 e 17,0 %. Essas argamassas possuíam aditivo plastificante incorporador em sua dosagem, o que levou aos valores altos observados (associado a um tempo de mistura elevado). O alto ar incorporado foi também a causa das menores densidades de massa no estado fresco das argamassas do grupo (obras) A e E.

Identificou-se também uma pequena redução na penetração de cone entre a condição de coleta em obra e o ensaio posterior feito em laboratório. Justifica-se isso pela perda de água e pelos processos entre os materiais na argamassa ainda plástica. Lembra-se que o tempo entre essas duas medições (obra e laboratório) situou-se em média por volta de 40 minutos.

Quanto ao ar incorporado, houve redução entre a coleta e as medições em laboratório (para a mesma amostra) somente nas argamassas com alto teor de ar (aditivo plastificante incorporador de ar). Nas demais o teor de ar ficou constante.

Nas situações de reprodução das argamassas em laboratório, reproduziu-se fielmente o traço mensurado em obra, não se fazendo nenhum ajuste do teor de água. Observou-se nesse caso uma leve redução no valor da penetração de cone, tendo-se uma média com 48,0 mm.

Na retenção de água observou-se um valor médio de 65 %. Observou-se que nas argamassas mistas dosadas sem o emprego do aditivo plastificante incorporador de ar (obras B, C e D) a retenção de água foi maior, chegando a valores superiores a 70%. Isso é fácil de entender, pelo emprego da cal com função plastificante e de retenção de água. Na amostra de estudo observaram-se valores inclusive inferiores a 60 % o que é uma condição muito crítica tanto para o processo executivo (manutenção da plasticidade), como também em aspectos favoráveis à fissuração e à deficiência de hidratação do cimento. Como referência, cita-se a normativa francesa (2) a qual exige retenção de água superior a 91% (Classe U5 ou superior – Tabela 6) para revestimentos em monocamada em condição de clima seco e quente. Considerando o clima de Brasília (quente e seco por 8 meses do ano), baixos valores da retenção de água constituem-se em favorecimentos à evaporação da água de amassamento e consequente fissuração. Não sendo especificado esse requisito, e também não o controlando, favorece-se enormemente o desenvolvimento de fissurações precoces que diminuem a capacidade de vedação das fachadas, reduzindo a vida útil e permitindo o desenvolvimento de manifestações patológicas.

Análise das propriedades no estado endurecido
A tabela 11 apresenta os valores observados nas argamassas dosadas em obra.


Observando o critério geral de resistência à tração, em termos médios o valor atende à classe R3. Observa-se alguns valores pontuais baixos nas amostras D1, C1, os quais quando foram reproduzidos em laboratório atingiram a faixa mencionada (R3). Agora, quando o critério passa para a situação de revestimento cerâmico (emboço para assentamento cerâmico), as argamassas estudadas que poderiam ser aprovadas, já se restringem exclusivamente à argamassa E (pelo critério do CSTB (2)).


Em termos de coeficiente de dutilidade, os valores observados estão próximos a 0,3 (média). O que se pode concluir é que todas as amostras estão na mesma faixa de dutilidade.

Para a resistência potencial de aderência observou-se um valor médio de 0,19 MPa. As reproduções em laboratório ou deram valor idêntico ou superior ao valor das argamassas coletadas em obra. Ficou evidente que as argamassas A1 e A2 tiveram o pior desempenho, e as argamassas E2 e E3 o melhor. Como a aderência potencial emprega um substrato padrão (placa cimentícea), ainda não se dispõe de relações que a comparem aos substratos usuais (blocos cerâmicos, de concreto). Assim a análise é relativa entre as amostras estudadas.

Em relação á capilaridade a situação observada foi muito crítica. O valor médio de 8,3 é o dobro do limite aceitável pela especificação francesa para uso geral. Todavia as argamassas A1, A2, E2,E3 apresentaram os menores valores para capilaridade, dentro dos limites aceitáveis (coincidentemente essas argamassas possuem aditivo incorporador de ar, o que pode ser uma hipótese para explicar a menor capilaridade). Por outro enfoque, as argamassas B1,B2, C2 e D1 apresentaram coeficientes de capilaridade extremamente elevados (superiores a 10). Uma vez que os valores de capilaridade são muito altos, é fácil entender os problemas observados quanto à fissuração, falhas de vedação (infiltrações) nos edifícios em uso. A não aplicação de critérios de capilaridade quer seja na formulação ou no controle de qualidade traduz-se também por manifestações patológicas graves observadas nos revestimentos conforme observam Bauer et al. (2011)(1) .

CONCLUSÕES/AGRADECIMENTOS

Do estudo efetuado pode-se enumerar as seguintes conclusões principais:

Ø  No comportamento geral as argamassas apresentaram-se deficitárias em vários requisitos avaliados, especificamente a retenção de água, resistência à tração e o coeficiente de capilaridade o que pode ser associado ao grande número de incidência de manifestações patológicas nas fachadas (1).

Ø  O teor de ar incorporado foi relativamente alto para as argamassas aditivadas, sendo também mediano para as argamassas mistas. O valor médio de 10% é considerado alto para essas argamassas. Uma explicação para isso, além das características de produção (tempo de mistura) pode estar no emprego de cales aditivadas de fábrica, que possuam aditivos em sua formulação;

Ø  Houve coerência nas propriedades no estado endurecido, ou seja, as tendências entre as diversas propriedades avaliadas apresentaram sentidos similares;

Ø  Para o coeficiente de capilaridade, valores superiores a 4,0 são críticos. Os maiores valores observados chegam a 4 vezes esse limite. Sem sombra de dúvida essas argamassas apresentarão muito provavelmente manifestações patológicas se empregadas externamente às fachadas e forem submetidas à umidade.
      
Ø  Existe uma necessidade premente na definição de valores orientativos para os requisitos estudados, bem como da inserção de rotinas de controle de qualidade satisfatórios. A amostra estudada consistiu de um universo de produção de campo onde não se empregavam procedimentos de controle de qualidade para os itens avaliados, o que pode explicar certos comportamentos atípicos relatados. Todavia deve ser ressaltado que existe um grande desconhecimento e um grande desinteresse técnico no ciclo da produção no sentido de se buscar atingir desempenhos mínimos adequados capazes de garantir a durabilidade e o atendimento à vida útil dos sistemas de revestimento.


Os autores agradecem ao Laboratório de Ensaio de Materiais/UnB (LEM), 


REFERÊNCIAS

 (1).BAUER, E.; CASTRO, E.K.; ANTUNES, G.R.; LEAL, F.E. Identification and quantification of failure modes of new buildings façades in Brasília. In: XII DBMC – International Conference on Durability of Buildings Materials and Components. 2011, Porto, Portugal. Anais 12th International Conference on Durability of Buildings Materials and Components: FEUP, 2011.
(2).GROUPE DE COORDINATIONS DES TEXTES TECHNIQUES – Enduits aux mortiers de ciments, de chaux et de mélange plâtre et chaux aérienne. Cahier dês clause techniques. Paris. CSTB, Cahiers Du CSTB,(309), Cahier 2413, mai 1990. Document Technique Unifié (DTU) n. 26.1.
(3).SILVA, N.G. Avaliação da retração e da fissuração em revestimento de argamassa na fase plástica. 2011. 320f. Tese (Doutorado) – PPGEC – UFSC, Florianópolis, 2011.
(4).VEIGA, M.R.S. Comportamento de argamassas de revestimento de paredes. Contribuição para o estudo da sua resistência à fendilhação. 1998. 458f. Tese (Doutorado) – FEUP, Porto(Portugal), 1998.
(5).Bauer, E.; Sousa, J. G.; Guimarães, E. A.; Silva, F. G. Study of the laboratory Vane test on mortars. Building and Environment, v. 42, p. 86-92, 2007.
(6).Cascudo, O.; Carasek, H. Cone penetration test proposal for the production control of mortars in construction-site. e-mat - Revista de Ciência e Tecnologia de Materiais de Construção Civil, v. 3, p. 77-90, 2006.




terça-feira, 18 de junho de 2013

ARTIGO TÉCNICO - AT 19 CLASSIFICAÇÃO DE DANOS EM CONCRETO


Agradeçemos a contribuição da Profa. Eliane Kraus na discussão desse importante tema. As dissertações ligada a temática podem ser obtidas em:
www.estruturas.unb.br
Boa leitura,
Prof. E. Bauer (mat and mat)


CLASSIFICAÇÃO DE DANOS EM ESTRUTURAS DE CONCRETO
Eliane Kraus de Castro (*), João Carlos Teatini de S. Clímaco (**)

(*)  Professora do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental - Universidade de Brasília – Laboratório de Ensaio de Materiais.


(**) Professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental  e do Programa de Pós-graduação em Estruturas e Construção Civil – Universidade de Brasília.


Revisão e adequação: pesquisador Manuel Alejandro Rojas Manzano (mat and mat)
Enviado por: Eliane Kraus de Castro

INTRODUÇÃO/ JUSTIFICATIVA/OBJETIVOS

A vida útil de uma estrutura de concreto depende de níveis adequados de manutenção, principalmente porque os eventuais problemas estruturais, sendo descobertos em seu início, têm seus efeitos minorados, reduzindo os custos de reparo. Entretanto, embora crescente o reconhecimento da importância da manutenção estrutural, são ainda insuficientes, mesmo em países desenvolvidos, as disposições normativas específicas para manutenção de estruturas. Em geral, as normas recentes dedicam atenção às disposições de projeto e execução tendo a durabilidade como requisito sem, no entanto, estabelecer critérios objetivos de manutenção [1], [3].

A partir desse fato, foi desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Estruturas e Construção Civil do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília (UnB) uma metodologia para avaliação de estruturas de concreto armado de edificações usuais, que estabelece critérios para a classificação de danos que permitem calcular o grau de deterioração dos elementos estruturais isolados e da estrutura como um todo, indicando as ações necessárias ao desenvolvimento da vida útil prevista [2].

Um dos testes iniciais de validação da metodologia foi sua aplicação a uma edificação residencial de propriedade da UnB, avaliada por Kraus [3], em 1994, e apresentado no presente trabalho. Os resultados obtidos indicaram a necessidade de intervenção em curto prazo, em alguns pilares e vigas da estrutura com grau de deterioração crítico. Os resultados constataram a contribuição da metodologia para o estabelecimento de uma estratégia de manutenção preventiva.

MATERIAIS/MÉTODOS/DESENVOLVIMENTO

Em 1987, a RILEM instituiu o Technical Committee 104 - Damage Classification of Concrete Structures, com a finalidade de unificar na Comunidade Européia dos métodos de teste e diagnóstico de estruturas de concreto, visando tornar mais efetivas as inspeções "in situ" e mais econômicos os eventuais reparos. O 104 - DCC enfatiza a necessidade de estabelecer sistemas de classificação e avaliação quantitativa dos danos, com "o objetivo primordial de minimizar a natureza subjetiva dos dados obtidos" [4].

Segundo a metodologia proposta nesta pesquisa, as estruturas de concreto de edificações usuais podem, em geral, ser divididas em famílias de elementos típicos: pilares, vigas, lajes, cortinas, escadas e rampas, reservatório superior e inferior, blocos de fundação, juntas de dilatação e elementos de composição arquitetônica. A partir de vistorias realizadas por profissional habilitado e orientadas por um Caderno de Inspeção associado à metodologia, seguindo o fluxograma da Figura 1, a metodologia permite quantificar o grau de cada dano nos elementos de uma família, os graus de deterioração dos elementos estruturais, das diversas famílias e da estrutura como um todo [3].



Figura 1 - Fluxograma para avaliação quantitativa da estrutura [3]

O fator de ponderação (Fp) quantifica o “prejuízo” relativo gerado por um determinado dano às condições gerais de estética, funcionalidade e segurança de um elemento estrutural. Para cada família de elementos, o Caderno de Inspeção apresenta planilhas com as manifestações possíveis de dano e os respectivos valores de Fp, numa escala de 0 a 10. Os valores do fator de ponderação foram estipulados a partir de extensa observação de estruturas danificadas e de aferições sucessivas da formulação.

O fator de intensidade do dano (Fi) é atribuído pelo profissional responsável pela vistoria, estimando a gravidade das manifestações, segundo a escala: sem lesões (Fi = 0), lesões leves (Fi = 1), lesões toleráveis (Fi = 2), lesões graves (Fi = 3) e estado crítico (Fi = 4). Entretanto, uma pontuação desse tipo pode resultar muito subjetiva, se não for acompanhada de uma classificação precisa da gravidade das lesões e sua evolução, que é fornecida no Caderno de Inspeção e serve de subsídio ao profissional em suas inspeções [3].

O grau de dano (D) em um elemento é calculado para cada dano, a partir dos valores correspondentes do fator de ponderação (0 ≤ Fp ≤ 10), e do fator de intensidade (0 ≤ Fi ≤ 4), usando uma analogia com o modelo de Tuutti [5], segundo o qual a deterioração se desenvolve em duas etapas distintas, iniciação e propagação dos danos. Propõe-se para o cálculo do grau de dano as expressões a seguir:


O grau de deterioração de um elemento ( Gde ) é determinado em função dos valores do grau de dano " Di " das "m" manifestações detectadas no elemento, a partir de uma das expressões seguintes:


Da Expressão (4), para elementos com mais de dois danos, o grau de deterioração do elemento, Gde, é a soma do grau máximo detectado com a média aritmética dos graus dos demais (m-1) danos. Ou seja, o dano maior seria "agravado" pela presença dos demais danos. A Tabela 1, elaborada a partir de ajustes da metodologia a situações reais, apresenta as ações a serem adotadas em elementos isolados em função do grau de deterioração, Gde:

 Tabela 1 -  Classificação dos níveis de deterioração do elemento


O grau de deterioração de uma família, Gdf, é definido como a média aritmética dos graus de deterioração dos ‘n’ elementos com danos expressivos, de forma a evidenciar os elementos em pior situação. Para "danos expressivos" estabeleceu-se o limite Gde ≥ 15, obtendo-se:


Finalmente, o grau de deterioração da estrutura (Gd) é calculado pela média ponderada dos graus de deterioração das diversas famílias de elementos, tendo como peso o fator de relevância estrutural, Fr , com a seguinte escala para as diversas famílias:

- Elementos de composição arquitetônica:                                                  Fr = 1,0
- Reservatório superior:                                                                                   Fr = 2,0
- Escadas/rampas, reservatório inferior, cortinas, lajes secundárias:     Fr = 3,0
- Lajes, fundações, vigas secundárias, pilares secundários:                   Fr = 4,0
- Vigas e pilares principais:                                                                            Fr = 5,0

Dessa forma, considerando as ‘k’ famílias de elementos que compõem a estrutura, tem-se:

Calculado o valor de Gd, da Expressão (6), classifica-se a estrutura em um dos quatro níveis de deterioração da Tabela 2, que indica as ações a ser tomadas. Cabe frisar a importância da análise individual dos elementos, pois pode ser recomendada a intervenção imediata ou em curto prazo apenas em elementos isolados da estrutura, dependendo do fator de intensidade de um dano ou do grau de deterioração do elemento. Ou seja, o nível de deterioração de uma estrutura pode ser aceitável do ponto de vista global, mas haver necessidade de intervenção em elementos isolados.

Tabela 2 - Classificação dos níveis de deterioração da estrutura



APLICAÇÃO DA METODOLOGIA

Aplicação em edificação residencial (1994)

A edificação avaliada, de propriedade da UnB, é constituída de seis pavimentos-tipo, térreo e subsolo, com aproximadamente 14.000 m2 de área construída, com estrutura em concreto aparente, dividida em três blocos por juntas. Foi inspecionado apenas o bloco central, com 4.670 m2. Após a análise dos projetos de arquitetura e estrutura, efetuou-se a inspeção, obtendo-se os resultados da Tabela 3, para alguns elementos selecionados segundo sua importância no grau de deterioração da estrutura, elementos estes reparados em intervenção realizada em 1998.

Na inspeção, destacaram-se os problemas seguintes:

a) Três pares de vigas do teto do subsolo: paralelas e adjacentes a uma junta de dilatação, cada par é apoiado na extremidade em um mesmo pilar da cortina. A contínua infiltração de água na junta entre as vigas, devido à lavagem de piso e água de chuva, criou um ambiente úmido constante, agravado pela impermeabilização deficiente, o que causou sérios problemas de corrosão nas armaduras dessas vigas, chegando a provocar esfoliação (desplacamento) do concreto. Da tabela 3 a metodologia calcula para essas vigas um grau de deterioração Gde = 116, índice crítico segundo a Tabela 1, que recomenda intervenção imediata para recuperar as condições de integridade da peça.

Tabela 3 - Viga


b) Pilares da cortina do subsolo: sustentam os pares de vigas do teto, analisadas no item a) acima. Destacou-se como problema mais grave, devido à concepção errônea do projeto estrutural não prevendo o movimento das vigas da superestrutura, por variações de temperatura, no topo dos pilares, ocorreu o esmagamento local do concreto nessas regiões, o que causou, ainda, exposição das armaduras e início de flambagem de barras da armadura principal na ligação viga-pilar. Das expressões (1) a (4), obtém-se para esses pilares o grau de deterioração Gde > 80, crítico pela Tabela 1, indicando intervenção imediata.

Tabela 4 – Pilar


Para os demais elementos, seguindo os mesmos procedimentos, obtém-se o grau de deterioração das famílias e da estrutura como um todo, mostrados na Tabela 5. O nível alto de deterioração 40 < Gd = 44,3 < 60, conforme a Tabela 2 indica, portanto, a necessidade de observação periódica e intervenção em curto prazo.

Tabela 5 - Grau de deterioração da estrutura


Aplicação da metodologia após os elementos recuperados (1998)

Passados 4 anos da primeira inspeção, a UnB colocou à venda as unidades residenciais do prédio em questão, tendo, somente então, decidido reparar os elementos estruturais com grau de deterioração crítico. Os serviços de reparo foram realizados por firma especializada nos elementos analisados no item anterior e nas juntas de dilatação. Nos pilares da cortina, com esmagamento no topo devido à falta de junta, foi feita, em suas extremidades, a solidarização de uma das vigas sobre o pilar, com a liberação da outra viga, que foi erguida mecanicamente para colocação de placa de neoprene fretado, minizando, assim, os movimentos da estrutura devido a variações de temperatura.

Para a recuperação das vigas danificadas por corrosão, foram utilizados os seguintes procedimentos: remoção do concreto desagregado e recomposição da seção utilizando argamassa à base de resina epóxi. As ferragens foram recompostas e limpas e aplicados inibidores de corrosão. Em alguns casos, houve necessidade de substituição de barras, tanto da armadura principal de flexão quanto da transversal, constituída por estribos. Complementando os serviços de recuperação, as juntas de dilatação foram recuperadas e impermeabilizadas, utilizando manta butílica e proteção mecânica.

Concluída a recuperação, foi aplicada novamente a metodologia, tendo em vista avaliar a relevância dos elementos recuperados, com os resultados na Tabela 6. Comparando as tabelas 5 e 6, pode-se constatar a queda acentuada no grau de deterioração das famílias de elementos “Viga principal” - de 46,6 para 12, “pilar” - de 70,6 para 8,6, e “Laje principal” - de 35,4 para 20,7.  O grau de deterioração global da estrutura caiu de 44,3 para 20,8. Todos os novos valores, conforme as tabelas 1 e 2, caracterizam, após o reparo, um “estado aceitável”, evidenciando o sucesso das intervenções e a contribuição da metodologia para a avaliação quantitativa da estrutura e de seus elementos.

Tabela 6 - Grau de deterioração da estrutura


CONCLUSÕES/AGRADECIMENTOS

Apesar de reconhecida a importância da manutenção, são ainda insatisfatórios nas normas correntes as disposições e critérios objetivos referentes a estruturas usuais de concreto. O trabalho apresenta uma metodologia que quantifica os danos em estruturas de concreto armado, e a sua aplicação em uma mesma edificação em duas situações: antes e após a realização de reparos em elementos da estrutura. Os resultados da aplicação foram satisfatórios, refletindo as diferentes situações físicas da estrutura e a adequação das intervenções recomendadas. Dessa forma, conclui-se que a metodologia proposta no trabalho pode ser relevante no estabelecimento de programas de manutenção de edificações com estrutura de concreto.


REFERÊNCIAS

[1]        Associação Brasileira de Normas Técnicas (2000), "Projeto de revisão da norma NB-1: Projeto de estruturas de concreto", Novembro.

[2]        Boldo P. (2001). “Avaliação quantitativa dos danos em estruturas de concreto de próprios nacionais gerenciados pela Diretoria de Obras Militares do Exército Brasileiro”. Dissertação de Mestrado, Universidade de Brasília, Brasil (em andamento).

[3]        Castro, E. K. (1994), "Desenvolvimento de metodologia para manutenção de estruturas de concreto armado", Dissertação de Mestrado, Universidade de Brasília, 185p, Dezembro.

[4]        RILEM (Reunião Internacional dos Laboratórios de Ensaios de Materiais de Construção) (1991), "Technical Committee - Damage Classification of Concrete Structures", Materias and Structures, Ed Champman & Hall, Vol. 24, nº 142, 320 p.

[5]        Tuutti, K. (1982), "Corrosion Steel in Concrete", Swedish Cement and Concrete Research Institute, Stockolm, 469p.