quarta-feira, 14 de agosto de 2013

ARTIGO TÉCNICO AT 10 - PAINÉIS PRÉ-FABRICADOS COM BLOCOS CERÂMICOS

Bom dia !
Apresentamos o artigo da Profa, Vanda Zanoni, conjuntamente com o Prof José Manoel Sanchéz, ambos da FAU/UnB. O artigo discute proposições sobre os painéis pré-fabricados com blocos cerâmicos, abordando questões relativas as tecnologias inovadoras.
Agradecemos aos colegas pela importante colaboração.
Boa leitura para todos.
Prof. E. Bauer

PAINÉIS PRÉ-FABRICADOS COM BLOCOS CERÂMICOS
Vanda Alice Garcia Zanoni (1); José Manoel Morales Sánchez (2)
(1) PPG em Arquitetura e Urbanismo – UnB, email: vandazanoni@unb.br
(2) PPG em Arquitetura e Urbanismo – UnB, email: sanchez@unb.br

 1. INTRODUÇÃO
A cerâmica, como material para construção, tem sido utilizada pela humanidade desde os tempos mais remotos, precedida somente pela pedra e pela madeira. A utilização deste material, tanto no passado quanto no presente, deve-se principalmente às suas propriedades, dentre elas, a facilidade de conformar diversas geometrias, o fato da matéria-prima utilizada na confecção do tijolo ser de fácil acesso em qualquer parte do mundo e as elevadas resistências mecânicas possíveis de serem atingidas por meio de seu processo de cozimento (OLIVEIRA, 2005). Observa-se a evolução tecnológica na produção dos produtos cerâmicos e a diversificação dos modelos de tijolos, blocos e placas, acompanhando as exigências das edificações e das novas técnicas construtivas.
A alvenaria é um sistema milenar, usada ao longo da história da arquitetura com diferentes materiais, composição e funções. Por ser conformada com pequenos componentes, é de fácil fabrico e ampla aplicação, adaptando-se perfeitamente nas diferentes escalas de implantação, tipologias e sistemas de produção das edificações. A construção com paredes de alvenaria
manteve-se hegemonicamente durante séculos e foi sendo substituída progressivamente desde meados do século XIX por sistemas de maior industrialização e capacidade resistente.
O uso de painéis pré-fabricados começa com a Revolução Industrial, iniciando com os painéis metálicos, mas pesquisas buscando o desenvolvimento de painéis de vedação e viabilizando a sua utilização ocorre principalmente a partir dos anos 50 do século XX.
Segundo César e Roman (2006), é possível observar no mercado da construção civil empresas utilizando painéis pré-fabricados, sendo estes predominantemente de concreto e como elementos de vedação. Para os autores, existe um vasto campo de pesquisa para investigação da fabricação e utilização de painéis pré-fabricados com blocos cerâmicos, fatores que, sendo atingidos, possibilitarão também a diminuição dos custos e dos tempos de construção.

2. ESTÁGIO DE DESENVOLVIMENTO
Desde meados do século XIX, o progressivo crescimento de sistemas com maior capacidade de industrialização não foi suficiente para competir com a hegemonia no uso das alvenarias conformadas no local. Mas, com a progressiva diminuição da mão-de-obra especializada e seu custo, assim como o desejo de aumentar a produtividade e diminuir o tempo de execução, observa-se potencializado o desenvolvimento tecnológico dos painéis pré-fabricados com cerâmica.
Dieste foi um precedente importante no entendimento das possibilidades da pré-fabricação da cerâmica armada, quando construiu em 1976 em Salto no Uruguai a cobertura para a estação de serviço Barbieri y Leggire. Esta lamina díptera em dupla mísula apoiada em um único pilar central foi construída in situ, mas por necessidade de seu traslado para outra zona a cobertura foi seccionada do pilar e reimplantada em outro pilar. Isso mostrou a capacidade da cerâmica armada e de seu sistema construtivo para a pré-fabricação, na inesperada mudança de lugar do seu abrigo de ônibus (SARRABLO, s/d).
Em 1984, Joan Villà começou a desenvolver pesquisas no Laboratório de Habitação da Faculdade de Belas Artes, com painéis de bloco cerâmico como caminho para a industrialização da construção em habitações sociais. O CPC (Construção com Pré-fabricados Cerâmicos) é constituído de módulos pré-fabricados básicos de painéis de tijolos cerâmicos solidarizados, medindo 45 cm de largura, 9 cm de profundidade e altura variável, com peso inferior a 100 quilos, produzidos sobre uma superfície horizontal. Sobre essa superfície é XIV ENTAC - Encontro Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído - 29 a 31 Outubro 2012 - Juiz de Fora disposto um gabarito metálico ou de madeira que recebe uma camada de areia na qual são posicionados os tijolos cerâmicos furados. As peças cerâmicas são acomodadas junto aos lados da moldura, de maneira a resultarem vãos de 4 cm de espessura, que serão preenchidos com concreto e armadura (VILLÁ, 1989).
De acordo com Villà, os painéis já podem ser manuseados para empilhamento cerca de dois dias após a confecção e estão prontos para montagem depois de uma semana. Dimensionados para permitir ampla flexibilidade na aplicação e manuseio sem ajuda de equipamentos e montagem manual por mão-de-obra não-especializada, são destinados à execução de paredes, lajes, escadas e coberturas (VILLÁ, 1989).
Na Universidade de Hannover, Martín Speth pesquisou cascas de cerâmica pré-fabricada recorrendo à geometria de dupla curvatura. Com este sistema que se denomina “monocoque de cerâmica”, Speth levantou em 1996 um arco de 2 m com 10 m de vão. Em 1998 construiu um arco com 16 m de vão. A lâmina de cerâmica pré-fabricada não precisa de armadura, pois nas juntas, é aplicada uma argamassa especial de grande aderência e resistência (SARRABLO, s/d).
Em Portugal, o grupo de pesquisadores da Universidade do Minho, com a participação de algumas universidades e empresas européias, produzem unidades de alvenaria com o intuito de desenvolver uma técnica de pré-fabricação aplicada às cascas de alvenaria cerâmica armada. O processo de pré-fabricação total de cascas em alvenaria cerâmica armada baseia-se no modelo proposto por Dieste (OLIVEIRA, 2005).
Na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o Grupo de Desenvolvimento de Sistemas em Alvenaria (GDA) e o Laboratório de Sistemas Construtivos (LABSISCO) em parceria com consultores nacionais e internacionais desenvolveram um processo construtivo constituído por painéis pré-fabricados estruturais com blocos cerâmicos. A largura de cada painel representa a soma das medidas dos blocos cerâmicos vazados, das juntas de argamassa polimérica (alta aderência e rápida secagem), e os 5 cm do perímetro de contorno do painel composto de microconcreto armado com tela soldada. A junta a ser utilizada para união dos painéis é de 1 cm, definindo a coordenação modular das medidas como múltiplos de 5. Ainda, o painel recebe os elementos de fixação e a argamassa de revestimento (CÉSAR e ROMAN, 2006).
Na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), estudos estão sendo desenvolvidos para a execução de painéis pré-fabricados de alvenaria protendida, utilizando métodos construtivos baseados no assentamento manual tradicional dos blocos cerâmicos para a alvenaria estrutural. Os métodos pesquisados contemplam desde a protensão em paredes conformadas no local, até painéis de grandes dimensões (4,00m de comprimento, 1,20m de altura e 14cm de espessura) com blocos cerâmicos de 14x19x39cm assentados com argamassa no traço 1:0,5:4,5 e barras de protensão dispostas na seção transversal do painel em caneletas grauteadas (SOUZA, 2008; PARSEKIAN, 2002).
Ainda, na busca pela inovação tecnológica e para atender as necessidades do mercado quanto às novas linguagens arquitetônicas e aos condicionantes de prazos, as indústrias cerâmicas têm desenvolvido peças cerâmicas de grandes dimensões (260/280 x 59,6 x 20 cm com 150 kg/m2 ou 30 cm com 200 kg/m2 com camada de isolamento termoacústico), que se configuram como painéis de cerâmicas monolíticas portantes (SARRABLO, s/d).

3. SISTEMAS CONSTRUTIVOS INOVADORES
No âmbito do SINAT (Sistema Nacional de Avaliação Técnica de produtos inovadores) os produtos e sistemas construtivos inovadores são aqueles que, não possuindo normas técnicas prescritivas específicas ou não sendo identificados como sistemas tradicionais consagrados pelo seu uso, precisam ser balizados para adquirirem credibilidade e reconhecimento perante os consumidores e os agentes financiadores. A redução dos riscos decorrente do desconhecimento do desempenho real de produtos não normalizados, o aumento da credibilidade, o estímulo e a disseminação das inovações tecnológica tendem a ampliar a oferta de tecnologias para a produção, principalmente no âmbito da habitação, visando a redução de custos e o aumento de produtividade (TÈCHNE, 2009).
A Diretriz SINAT é um documento de referência contendo diretrizes para a avaliação técnica especialmente desenvolvida para uma determinada família de produtos, baseado no conceito de desempenho de produtos (MITIDIERI et al, 2007). Para os sistemas construtivos inovadores são adotados requisitos, critérios e métodos de avaliação previstos na NBR 15.575:2008 - Desempenho de edifícios habitacionais de até cinco pavimentos.
Até o presente momento (maio de 2012), o SINAT já divulgou 5 diretrizes e 11 Documento de Avaliação Técnica (DATEcs) que são documentos síntese de divulgação dos resultados da avaliação técnica do produto, com base na metodologia determinada pela respectiva Diretriz (MC, 2012).
Dentre os DATEcs divulgados, verificam-se somente dois sistemas construtivos que adotam o bloco cerâmico como componente do painel (Quadro 1). Esses painéis estão vinculados a Diretriz SiNAT nº 002 que baliza as produções inovadoras em painéis estruturais prémoldados.



A Diretriz SiNAT nº 002 refere-se aos sistemas construtivos integrados por painéis estruturais pré-moldados, sempre tendo como material estrutural o concreto, associado ou não a outros materiais estruturais, de enchimento e de revestimento. A seção transversal dos painéis estruturais pré-moldados pode ser do tipo maciça de concreto; alveolar ou vazada de concreto (painel de concreto com células vazias) ou mista (combinação de nervuras de concreto e outros materiais de enchimento e revestimento) (MC, 2012).
De acordo com o DATec nº 008, o Sistema JET CASA é um sistema construtivo composto por paredes estruturais constituídas de painéis  pré-fabricados mistos de concreto armado e blocos cerâmicos para parede, e das ligações entre os painéis. A espessura total do painel é de 11cm, obtida por duas camadas externas de argamassa com espessura de 1cm em cada face, e
pelo próprio bloco cerâmico interno com 9cm de espessura. Os painéis possuem um quadro externo e nervuras internas de concreto armado comum. O enchimento dos painéis é feito com blocos cerâmicos vazados, com oito furos quadrados, com altura de 19 cm e comprimento de 19 cm; a largura dos blocos pode ser de 9 cm ou de 12 cm, dependendo do tipo de painel. As juntas verticais entre os blocos são preenchidas com argamassa. A armadura dos painéis é composta por treliças metálicas em todo o perímetro dos painéis, formando um quadro estrutural externo, e por barras de aço CA-60 com diâmetro de 5,0 mm e de aço CA-50 com diâmetro de 8,0 mm, distribuídas no interior dos painéis, formando as nervuras de concreto armado. As fôrmas são constituídas por pistas de concreto (base) e perfis metálicos (laterais), com parafusos e ganchos de travamento. A desenforma ocorre 24 horas após a concretagem. O sistema construtivo pode ser utilizado para casas térreas e sobrados, isolados ou geminados e possui como elementos inovadores os painéis e suas interfaces e ligações (MC, 2012) . 
Conforme o DATec nº 009, o Sistema CASA EXPRESS de painéis pré-moldados mistos de concreto armado e blocos cerâmicos para paredes é composto por paredes estruturais constituídas de painéis pré-moldados mistos de concreto armado e blocos cerâmicos, e das ligações entre os painéis. Os painéis possuem um quadro externo e nervuras internas de concreto armado comum. A espessura total do painel é de 11,5 cm, obtida por duas camadas externas de concreto comum sendo uma de 3 cm (face da fôrma) e outra com 2 cm de espessura acima do bloco cerâmico (face superior), e uma camada de argamassa de 0,5 cm de espessura na face superior do painel; o núcleo é formado pelo próprio bloco cerâmico com 6 cm de espessura. Os blocos cerâmicos vazados possuem dimensões e formato especialmente desenvolvidos para o sistema construtivo. A armadura dos painéis é composta por uma malha de aço inferior apoiados diretamente sobre a primeira camada de concreto e outra superior, dispostos sobre os rebaixos dos blocos cerâmicos. As fôrmas são constituídas por pista de concreto (base) e perfis metálicos (perímetro dos painéis e vãos dos caixilhos), parafusos e ganchos de travamento. A desenforma ocorre 48 horas após a concretagem. O sistema construtivo pode ser usado para casas térreas isoladas ou geminadas, sobrados isolados ou geminados, casas sobrepostas e edifícios habitacionais de dois pavimentos (térreo e superior) (MC, 2012) .

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estágio de desenvolvimento tecnológico atual da construção civil requer a aplicação de novas tecnologias que atendam as demandas de uma produção com maior grau de industrialização. Neste contexto, os sistemas construtivos com painéis pré-fabricados com blocos cerâmicos é uma solução tecnológica que tenta ser competitiva, ao mesmo tempo em que mantém suas características tradicionais de composição com pequenos componentes (bloco cerâmico).
Prospectando o potencial para o desenvolvimento tecnológico no Brasil, identifica-se o predomínio dos sistemas construtivos com painéis pré-fabricados estruturais planos, caracterizando-se como vedação pesada, em detrimento dos sistemas construtivos com painéis que recorrem à geometria de dupla curvatura. Quanto aos diversos métodos e técnicas verificados, observa-se a seguinte tipificação:
Painéis de alvenaria com blocos assentados com argamassa convencional;
Painéis de alvenaria com blocos assentados com argamassa colante;
Painéis mistos, com alvenaria e nervuras de concreto armado com armaduras em barra e treliças,  inclusive no reforço perimetral;
Painéis de alvenaria, sem nervuras internas, somente com reforço perimetral;
Painéis de alvenaria com reforço perimetral em quadros metálicos;
Painéis de alvenaria com reforço perimetral composto de microconcreto armado com tela soldada;
Painéis de alvenaria protendida;
Painéis configurando-se como blocos cerâmicos monolíticos de grande dimensão.

No estágio atual de desenvolvimento dos painéis, existe uma diversidade de possibilidades tecnológicas demonstrando que essa tecnologia ainda está em fase de consolidação com grande potencial para a inovação tecnológica, principalmente relacionada aos assentamentos de blocos com argamassas de alta aderência, simplificação dos sistemas de nervura e enrijecimento com concreto armado e uso de protensão. Vários estudos estão sendo desenvolvidos por grupos de pesquisa em Instituições de Ensino, tanto no Brasil quanto no exterior, buscando o desenvolvimento tecnológico dos sistemas construtivos pré-fabricados com blocos cerâmicos, o que reforça a tendência que esta tecnologia vem demonstrando na sua capacidade de inovação. Como tendências para a continuidade do desenvolvimento tecnológico e a inovação, assinalam-se aquelas relacionadas com os painéis em alvenaria protendida com junta seca, eliminação dos sistemas que usam nervuras internas de concreto, soluções mais racionalizadas para os reforços perimetrais que colaboram com o içamento, eliminação das camadas de revestimento com possibilidades para a alvenaria aparente ou acabamento final em monocapa, entre outras.

REFERÊNCIAS

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS – ABNT- NBR 15.575-1. Desempenho de edifícios habitacionais de até cinco pavimentos – parte 1: geral. São Paulo, 2008.

CÉSAR, Cristina Guimarães e ROMAN, Humberto Ramos. Pesquisa e desenvolvimento de processos construtivos industrializados em cerâmica estrutural. Cap.5 . p- 116 a 159. In: Inovação Tecnológica na Construção Habitacional / Editores Luís Carlos Bonin [e] Sérgio Roberto Leusin de Amorim. — Porto Alegre : ANTAC, 2006. —(Coleção Habitare, v. 6).

MINISTÉRIO DAS CIDADES (MC). PBQP-H - Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat. SINAT - Sistema Nacional de Avaliação Técnica. Disponível em http://www4.cidades.gov.br/pbqph/ projetos_sinat.php. Acessado em fevereiro de 2012.

MITIDIERI Fº, C.V.; CLETO, F. da R.; WEBER, M.S. Desenvolvimento e Implementação do Sistema Nacional de Avaliações Técnicas de Produtos Inovadores (SINAT). V SIBRAGEC: Campinas, outubro 2007, 10p.

OLIVEIRA, J. T. DE. Estudo experimental sobre a pré-fabricação de cascas de alvenaria cerâmica armada. Portugal, 2005. Tese (Doutorado) - Escola de Engenharia da Universidade do Minho.

PARSEKIAN, G.A. Tecnologia de produção de alvenaria estrutural protendida. São Paulo, 2002. 258p. Tese (Doutorado) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo.

SARRABLO, V. La cerâmica avanzada. p.4-21 In: TECTONICA – monografias de arquitectura, tecnología y construción. Cerámica (I). 15 cerramientos. Madrid: ETC Ediciones (desde 1995).

SOUZA, P. R. A. Desenvolvimento de painel pré-fabricado em alvenaria protendida. São Paulo, 2008. Dissertação (Mestrado). Universidade Federal de São Carlos.

TÉCHNE. Sinat. Reportagem de Renato Faria. Ed.150, setembro de 2009.

VILLÁ, Joan. Painéis pré-fabricados de cerâmica vermelha. Cap.7; p.168-210: Dez alternativas tecnológica para habitação. Brasília: MINTER/PNUD, 1989.





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